Gotas de um Conto

Certa vez vi que Jiraya procurava no lixo de suas lembranças uma resposta a suas preces. Ele não se via com bons olhos aos quarenta, pois carregava os mesmos ‘demônios’ de sua juventude. E somado a isto, hoje se encontra quase sem cabelos, dentes amarelados e dedos fedidos por causa do cigarro; tem a pele do rosto estragada do barbear mau feito. Apesar de seu horror a morte, era com freqüência que pensava em dar fim a sua vida, estava claramente perdido, sem noção do porque estava vivo. Sentia-se desconfortável com qualquer verdade, mesmo assim queria crescer, se afastar da massa, excluir o conforto e com isso se preparar para o sofrimento. Sabia que tinha de superar o sexo, não ser mais vítima do poder delas [mulheres], ou seja, de sua própria luxúria e assim resgatar seu herói interior. E diante de tantas tarefas, Jiraya questionava se suas metas eram de fato suas, ou se aconteceram como um acidente. Era preciso decidir entre apropria-se ou não destas metas pra não tornar sua vida um acidente também.
Fatigado por estas questões, preferiu ir dormir e encarar outra realidade, um mundo de um sonho falante, que quem fala é a voz de sua consciência, de suas vontades. Um terreno em que criatividade e descoberta não precisam ser geradas na dor; onde perigo e mistério não carecem andar de mãos dadas. Neste mundo, o tempo não é mais um fardo e viver além dele não representa mais um desafio. Deveres não são mais um pretexto e nem uma cortina para o isolamento. Um lugar que dispensa ‘modos secretos’ de suportar a solidão e com isso não ter de se preocupar que seu corpo só seja descoberto pelo fedor, mas sim em meio alegria do convívio. Onde a melhor felicidade é realmente aquela que acontece e não a que poderia acontecer. E por se sentir tão bem acolhido neste [quase] novo mundo é que nosso amigo Jiraya resolveu nunca mais acordar.

Cor de Carne

Não me dê nomes. Conheça apenas a natureza em si e não deixe isto escapar, se for capaz. Aliás, conhecer não é o mesmo que pensar!
O que fazer?
Sair daqui?
Mas eu sei que se existe prazer foi pra levantar quem tem preguiça...
E me perpetuar é só mais uma desculpa pra gozar. Pobre do sexo! Ou melhor, do gozo.
Se [ele] soubesse que só existe pra dá continuação de nós nos outros e, pior que isso, é dá ‘trela’ as poesias do Tesão.
Então tem que merecer meu mover. Não costumo andar gratuitamente. Tem que haver mais, muito mais do que desculpas que matam preguiça.
Tem que merecer.....
Mas Atenção!
Não me canse. Não espere muito, por insistir. Apenas mereça. Porém, se insistir em fazer caras e bocas, eu vou dormir. Perseverança nunca foi sinônimo de merecimento....
Agora, se que só atrair minha atenção sem merecer, conte uma piada.














Por Sanchez

Imagens

E se acordei na madrugada, foi pra enganar o tédio. Foi pra apresentá-lo a uma longa manhã e enfiar na sua cabeça que o dia tem três pedaços. Queria cansá-lo. Talvez o próprio tédio se entediasse de me entediar, se cansasse e me deixasse em paz.

Tentei acreditar numa nostalgia de tempos não vividos, saudades de um lugar que nunca vi. Mas não tem como. A verdade disto está na poesia de escrever e não na mentira de sentir.

E se cada dia me afasto da infância, é fazer força pra não acreditar que depois dos 10, tudo é decadência. É esperar um amanhã melhor, porque a certeza de um ontem mais legal é me importar demais com o dia de hoje. Parece que o copo cheio fica cada vez mais vazio, do meio pra cima.

Fico cego ao enxergar o doce, acho pesado o verde com vermelho, roxo e amarelo; De tocar sua alma e ouvir sua dor. É pensar que os sentidos não fazem sentidos quando não seguem a ordem de sentir o que temos de sentir, onde temos de senti-los. É confuso. Leviano. Vivaz demais.

E se me chamam de forte, foi por culpa da rejeição e hoje sou até capaz de rir e de fazer piadas disso. E pensar que ser fraco é tão lícito.

E ela tinha razão. “Carência e proximidade”. Era só confusão mesmo. Foi como beijar minha irmã, para tanto fiquei mais aliviado e ela também. Pelo menos superamos a ‘caretice’[de somos amigos], pena não existir prêmio pra isso.










Por Sanchez



Onde as Folhas Dançam

Não. Definitivamente não.
Não tenho simpatia por paradoxos.
Evito comentários de quem se afasta [dois metros], senta na calçada com olhos vazios, pescoço curvado, cabeça cheia do que deve pensar pra parecer não pensar em nada e enjoar do seu próprio timbre de voz, quando afirma – mais uma vez – está bem.
Não gosto do carro de Apolo e concordo serem mais bonitas as folhas secas do outono. Gosto de lideranças, de quem faz questão que seu ‘bom senso’ filtre as ações dos amigos. Porém, prefiro água não filtrada.
Gosto de escritas longas e cansativas, das que lemos em voz alta e dizemos ‘ahan’, quando é perguntado sobre o entendimento, mesmo sendo mentira. Melhor mesmo é ceder à preguiça do que escrever.
Lamento pelo amor e suas irônicas rimas [dor], no arrepio sentido do espirro perdido. E definitivamente não gosto do que ficou no fundo da caixa de Pandora. E terminar sempre foi mais convidativo do que começar novamente.









Por Sanchez

Resgate

É tempo de resgate, de trazer o que foi para ‘ser’ e, portanto, permanecer.
É ver o passado deixar de ser aquilo que não é mais, para continuar sendo e não perecer.
Por que se um dia eu quis ser rebelde, foi para negar meu contentamento de ordem...
E se escolhi o ‘vermelho da igualdade’, foi devido a carência sutil de 'luz' das diferenças...
E se meu cabelo cresceu, foi pra dizer que não dava mais pra ‘podar’ os meus desejos.
E se um dia aquilo que se passou 'era' algo que não é mais, hoje continua sendo aquilo que foi, ao mesmo tempo em que não 'é'.
É ver a inércia do que não muda e do incorruptível ser degradada. Testemunhar o ‘devir’ revelar sua face e preparar o terreno para as ‘metamorfoses andantes’ do dia-dia.
É o passado - que assume o lugar de direito do presente - comumente confundido com o ‘vir a ser’...
O que antes dava assento para o outro, agora reivindica seu lugar de volta.
É ver o modismo demodê da moda, desenterrar motivos para amar e agredir o que não é belo...
É confundir-se com uma Ortodoxia de ‘bermudas’.
É ser reacionário unicamente por reagir.
É conseguir, a todo o momento, fundar um conceito de anacrônico.
É empalidecer com os novos [velhos] costumes, dar espaços as novas [velhas] guerras...







Por Sanchez

Tango


Não foi a primeira vista. Longe disto. Era um desacordo seguido de outro. Eu não conseguia entender e, muito menos esforçava-me em querer compreender as nuances do que ou quem mostrava-se aos meus olhos. Pensava ser mais simples encontrar seus pontos e frases de efeitos, em que decorar milimétricamente sua superfície, facilitaria seu entendimento. Uma apreensão rasa e equivocada de seu mundo. E quando cansei de me perder, por conta da insistência desta “decoreba burra”, me dei ao trabalho de aprender um pouco. E estava seguro das surpresas, que a todo momento apareceriam, e de um conseqüente turbilhão de sentimentos ideários de extroversão.

Mesmo assim, fui tomado por uma paixão arrebatadora e sem escrúpulos. Uma atormentadora poesia [quase] capaz de emoldurar e situar o intangível espaço/tempo. E quando ousei um segundo passo para conseguir dar meu primeiro mergulho em águas mais profundas de um oceano preguiçoso, percebi no ‘íntimo’, que sentimentos ideários de extroversão são filhos, intencionais ou não, de uma “propaganda demodê e enganosa”.

Diante desta situação de estranhamento por não conseguir aplicar valor ao belo apresentado, entendo o porquê tantos abandonaram esta ousadia, qualificando suas ações em frustrações. Porém, a frustração estava fora de cogitação, pois o que frustrava uma maioria, encantava uma minoria. Era este movimento ininterrupto de seu mistério que amadurecia cada momento os nossos corações. Uma mixagem intempestiva de euforia, encantamento e enigma, que deixavam-se orquestrar num ritmo dançante, como se em nossas veias circulassem sentimentos inimitáveis.

Certamente ela conseguia responder todos os meus questionamentos dos porquês as pessoas se casam; pelo menos era uma justificativa mais aceitável. E com ela me ‘casei’. Fazíamos um do outro sua testemunha viva, seu porto seguro e inspiração para as conquistas da vida. Vitórias que somente ganham conotação de importância quando temos com quem partilhar. Era o ventre e vazão dos meus sonhos, e eu a semente e sustentação de sua existência.

Frutos. E somente frutos era o melhor que ela pode me deixar. Numa ‘tragédia’ prevista, fomos acometidos por uma fatalidade e eu presenciei sensorialmente sua vida esvaindo-se, como se escorresse pelo ralo de um banheiro fétido. Lembrar da dor que sentir quando ela partiu, é agonizar com uma coroa de espinhos na cabeça. É ter a vontade de transgredir o sagrado, sentir uma pesada dor nos dedos ao escrever uma carta-testamento e me deprimir com um malogrado ponto final.

E aquela pequena criatura, fruto maior de nosso emaranhado calor, é uma hospedeira inata de sonhos outrora sonhados e um amontoado conteúdo correlato, resultado de nosso capricho [des]pudorizado. Entretanto, não era simples ignorar a falta que ela me fazia e de todos os predicados de conforto transcendente que, ao mesmo tempo, me era dado. E somado a isto, ver nosso ‘filhote’ se perder em trevas e desespero, em função do largo tempo que se passou e do distanciamento; do mesmo modo, a sua não-sociabilidade, sendo um inconveniente para o seu crescimento/prosseguimento.

Tudo isto alimentava uma probabilidade certeira para seu definhamento racional. Afogava-se em uma desesperança silenciosa e comum aos conteúdos sem cascas, disformes em formatos e multifacetados em sua essência. E um grito ‘rasgante’ sobrepuja o silêncio de seu desespero e com um toque de classe, recusa-se a existir.

Numa [relativa] pequena saga, o desvanecido destino me ‘castrou’ pela segunda vez, transfigurando minha vida numa substanciosa caricatura. E foi com maestria que o [des]virtuoso vento do norte preencheu o desvão – entre o início de minha história e o presente – com um sentimento ‘Tango’. ‘Um pensamento triste que se pode dançar’.


Copo Americano


Era uma situação inversa, no mínimo menos habitual do que normalmente acontece. Desta vez a vitima era uma descendente de Eva e não um varão, herdeiro do trono de ‘trouxa’, pertencentes aos filhos de Adão. Reconheço o esforço dela para ser discreta naquela arrebatadora paixão cega, mas para as pessoas mais próximas, mais coniventes com suas ações e indubitavelmente confidentes, seu comportamento era gritante e de fácil verbalização.

Mesmo assim, não era simples observar o que acontecia, exatamente por não compartilhar de seu grupinho seleto de ‘segredinhos’. Da mesma forma, também se deve a minha inflexibilidade em relação a uma possibilidade de tormento e dor, no seio daquelas que com facilidade, competência e freqüência, faz de nós, homens, bons em conviver com um estranho amargo sabor da derrota.

Elas que historicamente fazem de nós homens, um simples ornamento para sua figura e ‘ego’, que sempre tem nas mãos as mais variadas ferramentas para apreensão, envolvimento e fidelização de um rebanho do sexo oposto. Com ela verifica-se que este clichê temporal não tem validade, é apenas uma balela abstrata que não encontra prática quando direcionada a quem se deseja.

Na espera de uma oportunidade, ela se camuflava de uma amiga, melhor amiga ou a mais confiável, algo que a fizesse estar perto dele, de quem torce por ele. Porém as conseqüências não eram legais. E ele com sua popularidade, fruto de seu carisma sorridente, e mesclado pela suas ações desprovidas de preocupações, acomodava-se nas ‘permissões’ que sua imagem lhe permitia.

Pior do que presenciar ela ceder à insistência dele para que servisse de intermédio para outras garotas, ou se permitindo ficar junto de garotas quaisquer na sua frente, era saber que ele fazia isso consciente dos sentimentos dela para com ele. Ver a ‘secura’ de seus olhos, era entender esforço que fazia de não demonstrar dor com lágrimas, em que ser discreta era seu lema pessoal, para demonstrar/representar que ele era um passado já superado, mas era inútil.

Nestes momentos presenciados, onde o ponteiro referente aos segundos parece percorrer uma circunferência do tamanho de Júpiter, é que sua mente deve reconhecer que o termo Caos, está mais para um conceito do que para qualquer outra coisa. É refazer em sua mente o percurso de sua história até aquele momento. Lembrar de situações de embriaguez mútua, trazendo para o campo da simplicidade um ‘mísero’ ato de ‘ficar’ junto de quem tanto se quer.

Não dava para saber o tamanho do limite de seu orgulho. Parecia não ter fim, permitia muitas coisas e situações dolorosas que necrosavam seu coração e sua sensibilidade para o bom senso. Sequer era passível de sentir a preocupação daquelas [amigas] que incansavelmente se perdiam em investidas, na tentativa de devolver-lhe o discernimento.

E depois de tanto labutar a espera da oportunidade perfeita, de tanta dor refletida em lágrimas detidas de se mostrarem, de tanto ‘ficar de graça’ pra ele é que ela, num gole seco de saliva permitiu-se a sentir uma última dor. A famigerada dor de terminar um sonho, um projeto e um caminho sem ao menos ter de fato começado, e ao lado dele.

Não dava mais para fantasiar a realidade com uma névoa onírica. Ela tinha de entender que se deixar a mão no fogo, certamente vai doer mais cedo ou mais tarde, e de uma forma interessante doeu mais cedo, entretanto, ela só gritou e tirou a mão mais tarde, na qual ficou agonizando durante um bom tempo. E como diz o Poeta “a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional”, pelo menos esta era a sua nova fé.

Era Uma Vez...


Era uma vez um som cadenciado, estalos cada vez mais agudos e que flertavam sistematicamente com estrondos mais ocos, um barulho que causava uma sensação estranha, em especial e neste momento, no partir do Sol. O Céu parecia um grande borrão avermelhado, lembrava tristemente uma lágrima de sangue. Na tentativa de encontrar o motivo de tanta agitação para os meus ouvidos, esbarro na brutalidade. E todo aquele estardalhaço resumia-se em colocar uma existência no chão, fazer de uma história de companhia e conforto um amontoado de estilhaços.

Desde que me entendo por gente, ele sempre esteve ali, no seu refúgio único, imóvel, desprovido de quaisquer intenções que não fosse a de se sentir bem somente com espaço que tem, assim como, o que ele é apenas em si e por si, mesmo sendo o pilar único e necessário para sua própria alegria de ser e existir. Alienado e feliz, este parecia ser o seu lema, pois era como se comportava diante de tudo que acontecia a sua volta. Dono de uma indiferença mortal e distinta. Na realidade era uma apatia muito complacente com qualquer dor que fosse levada aos seus ouvidos.

Tinha uma presença que clareava qualquer dúvida, um espírito forte e bem resolvido que conseguia dá norte toda falta de direção, sem sequer arranhar sua autonomia. Com a permissão dele derramei minhas primeiras lágrimas de ressaca moral, chorei a perda dos entes mais queridos que um dia me fizeram sorrir. Na sua companhia eu flertei desconcertadamente pela primeira vez, foi testemunha de meu primeiro beijo e o único que não duvidou da perda de minha virgindade.

Com ele vi de perto o atropelamento de meu primeiro cãozinho, ainda filhote, e ainda foi vítima do esguicho de sangue por conta do tamanho e velocidade do carro e, com isso, ficou todo sujo, igualmente a mim. Era alvo do blá blá blá dos meus pensamentos, em voz alta, das reflexões diárias daquilo não conseguia compreender, do "vê para crer" nas coisas e de análises errôneas sobre comportamentos e o funcionamento do todo.

Certamente me viu chorar escondido, depois de eu ter assistido filmes 'bestas', daqueles de finais tradicionalmente felizes [de viverem felizes para sempre], compartilhou comigo o mesmo não entendimento do meio e, principalmente, do final da novela Cubanacam. Não consigo me lembrar do quanto esquentei seus ouvidos com minhas histórias de amores mal e não correspondidos e das tristezas que isso me causava. Ali, com ele, eu literalmente descarregava todo o peso de minha vida e de meu amador modo de viver grosseiro e ingênuo.

Eu ao menos tive a oportunidade de dizer isto para ele, do quão especial ele se tornou e, de tal forma, que ainda faz o intermédio de minhas ações. Queria poder falar com ele uma ultima vez, mas não aquelas mesmices em que estava acostumado a ouvir de minha parte e sim um obrigado com letras maiúsculas. Todas as vezes que saio de casa, exatamente na porta, do meu lado direito, é inevitável, tenho de olhar para aquele vazio e sentir um aperto na garganta e uma sensação estranha no peito. Enfim, nada está lá, somente às marcas de quem um dia por tanto tempo viveu naquele lugar. E hoje, o que posso dizer senão que tenho saudades de meu banco!






Mausoléu


Não acreditava muito no que estava realmente acontecendo. Tanto tempo que isto não acontecia. Era uma sensação pavorosa e, ao mesmo tempo, tão cômica. Na verdade beirava o ridículo, apesar de ser um ridículo que há muito eu procurava. Não tinha mais palavras para conduzir aquela situação, a retórica tinha acabado, a eloqüência me abandonado e o jogo de persuasão desprovido de sentido. Então porquê daquela situação? O porquê das mãos no bolso e depois segurando a alça da mochila? Dava para sentir a força desmedida da pulsação no pescoço, melhor ainda, eu sentia a pulsação do coração no corpo inteiro. Tudo tão pré-púbere. O olhar não se focava mais, o sorriso amarelo que se mostrava no canto da boca, fruto do constrangimento, era trêmulo.

Eu estava bobo como uma garota. Nem mais das circunstâncias eu conseguia me aproveitar, manipulando-as. Pensei que depois de um bate-papo despretensiosamente sugestivo, o imã dos dois lados reagiriam por si só. Até cogitei a possibilidade de ser uma falta de ‘ok’ da parte de lá, porém mais ‘ok’ do que aquela imagem na minha frente, mutuamente imóvel e que estava à espera de uma ação para deflagrar a sua reação, era aguardar uma autenticação feita em cartório. A situação não dependia mais de um ‘clima’, transcendia a isso.

Inicialmente era um cortejar simples, discreto e não menos intencional. Era uma troca de divagações confidenciadas, na busca de uma pseudo-intimidade. Depois de tanta elucidação de nós mesmos para o outro, de um jogo de espera, de possibilidades, oportunidades e, principalmente de conveniência, é que sou agraciado pela sorte do destino de não somente sentir o aroma de um desabrochar de uma Rosa, mas presenciar de perto, como lentamente suas pétalas transmutaram-se, até alcançar sua plenitude. Agora é um enfrentamento direto, olho no olho e com direito a atos falhos, sem distrações ou desculpas e desarmados do recurso do encontro casual.

Presentemente estou aqui, em frente o portão de sua morada e, entendendo por que este (portão) é tão citado, mesmo como coadjuvante, por poetas Seresteiros. É testemunha muda de um universo cansativamente singular, de um fazer e não fazer. Neste momento faço uma série de simulações de porcentagens e possibilidades de resultados satisfatórios na minha imaginação, caso eu tivesse me precipitado em favor de um ultimato.

Não consigo tirar da cabeça a cena de um Filme,
Dr. Hitch, Conselheiro Amoroso, quando ele diz da mulher que está parada na porta da casa dela com você e segurando a chave na mão, é que ela espera algo acontecer, uma iniciativa sua, uma abordagem direta, segura, certeira, seca, abrupta. Nunca fui muito bom em seguir conselhos ou exemplos, algo sempre me faz sair fora da trilha. Inclusive até pensei em fazer um pedido e, pedir justamente aquilo que eu mais queria na vida, naquele momento. Fazer do Ursinho Pooh uma referência e, da mesma forma que ele insistentemente pedia para Abel por mais um pote de mel, eu pediria a ela o que de mais doce poderia ter, seus lábios. O que também não aconteceu.

Entretanto, não existia mais a necessidade de adiar as coisas, na verdade nunca houve esta necessidade, sobretudo de contar com o amanhã como aliado para um fazer acontecer. Deixando-me tomar pela impetuosidade e abstendo-me das balelas que o medo produz na mente para o não agir, fui de encontro ao ‘pote de mel’ e confesso que quase o congelei, quando eu coloquei minhas mãos sobre este, pois estavam tão frias. O melhor de tudo estava para acontecer, quando eu interrompi o que tanto demorou a realizar-se, para enfatizar o que não era segredo, e um “eu estou nervoso” foi o que eu disse. Palavras repletas de magia, nostalgia, poesia e, em especial, dotadas de um misto de ingenuidade, honestidade e sinceridade que temia ter perdido.

Apesar de toda esta intensidade e caos comportamental de minha parte, ao que tudo indica, foram apenas obstáculos unilateralmente criados e tampouco suficientes para fazer desta situação, algo mais do que uma simples experiência de vida.

Cortinas de Seda


É triste ter que presenciar a pessoa que mais queremos perto de nós, nos evitar. Confesso que inicialmente no nosso relacionamento, ou melhor, em todo nosso relacionamento eu fui apático. Fui ridiculamente indiferente, não levei em consideração os sentimentos dela em relação a nós dois, seu bem-estar, seu conforto, sua alegria, sua cumplicidade; nem ser seu amante de fato eu consegui. Longe disto! Tratava-a quase como uma boneca inflável, procurava-a esporadicamente, talvez para desejar, por telefone, uma boa noite ou para um pedido de pesquisa na internet. E quando paro realmente para pensar no que se passou, sequer consigo lembrar de algum beijo ardente, ou de um beijo decente. Tudo tão mecânico, tão chato, parecia conveniência pura, uma satisfação social e egoísta.

Não me sentia inspirado a manter aquela cadência machista que me movia quando a vi pela primeira vez, tão solitária e sedenta de calor humano, desprotegida, cabeça baixa, sozinha e o melhor, solteira. “Queria protegê-la com meu sentimento e me embriagar com o teu perfume”. Aquela cena me motivava, despertava um ‘cosmos’ interior tão fantástico e desconhecido, era uma impulsão a cada momento, a cada suspirada e a cada centelha de raio de sol. Era uma surpresa imediata a cada ação que eu fazia por e para ela. E quando assustei, descobri que minha existência restringia-se a um sorriso que ao menos era o meu, e que meus sentimentos por ela se resumiam a um clichê sobre amor, em que só passando-se por tal situação, este pavoroso clichê reveste-se de outras conotações.

Era indescritível. Porém era algo que contagiava. Consegui involuntariamente contaminar a todos com aquele sentimento, como se eu fizesse com tudo que me cercava se apaixonasse também, na qual a própria Natureza esforçava-se para eu realizar aquela missão, que seria certamente mais gratificante que o término dos 12 trabalhos de Hércules. De súbito, era “como se o teu corpo sedutor passasse a ser o meu costume, um sonho lindo que eu gostava de sonhar”. E com o tempo deixou de ser um sonho, apesar de que todas as vezes que eu a via na minha frente, ela mantinha uma áurea onírica em volta de sua imagem. Antes de tudo, ela sempre foi um pensamento gostoso, a própria felicidade arraigada na possibilidade de “ouvir sua voz em cada amanhecer e do lado dela ver a vida acontecer”.

Pior que ter de afirmar isto tão claramente, é não ter percebido os fatos antes de desenrolarem, acontecerem e me deixar assim, jogado as traças da solidão. Eu ao menos tive a hombridade de reconhecer os gritos do relacionamento, as lágrimas dela almejando tempero em nossa convivência. Lembro do seu lamento, de suas conversas cansativas do presente momento. Fingia que não a ouvia, porém, lá no meu íntimo mais profundo, não negava nada do que ela reclamava. Era tudo verdade. Nunca entendi o porquê de meu comportamento tão ‘meia-boca’ com um relacionamento que teve um sentimento de origem tão agradavelmente destruidor.

Agora olha só para mim! Depois de perdê-la por não te ouvido-a, e ao menos quis saber. O que eu fiz com seu amor? O que eu fiz comigo? E o seu coração já possui um novo amor. E pensar que eu joguei fora tudo que me deu, juntamente com você. Observando sua nova caminhada e com uma recíproca razão guia de viver, penso que não posso fazer nada e que é tarde demais. Por mais que eu esteja disposto a te mostrar o quanto eu sempre quis e quero você, está contigo, fazer de minha presença ao seu lado um blá blá blá de amor e esclarecer os porquês de minha insensibilidade primeira, não tem como! Apesar de que sua felicidade fora de minha jurisdição me faz chorar. Mesmo ouvindo suas palavras recheadas de eufemismos terapêuticos, quando me falava que não dava mais, que perdi e que não fazia mais sentido está junto a mim, à dor foi inevitável.

E para fugir da moléstia do desespero causado pela dor de minha memória, pelos mementos não valorizados, pelo prêmio conquistado e ter feito do troféu um item de reciclagem, é que tenho de matá-la em minha mente, em minha vida e de meu passado. Preciso viver, respirar, caminhar, endireitar, transpirar, renascer, transar e para tanto tenho que deixá-la mais do que para trás, superá-la ou suprimi-la, mas sim anulá-la, apagá-la, por que trazer a tona memórias e lembranças é reviver o passado e por conseqüência não ter presente, e na ausência deste, se privar da única arma capaz de fazer do futuro um espaço decente para ser feliz. E pensar que o destino matou um sonho bom que um dia eu sonhei.





Magníficos

Nunca consegui entender o porquê daquela sua deliberada decisão. Não faz nenhum sentido, principalmente com ele, sempre tão bem esclarecido e precavido aos desaforos de tempos que ainda virão. Quando me deparei com aquela imagem estampada no teu corpo, ainda com fragmentos de sangue, com a sensibilidade de sua pele agredida em prol de uma representação não mais restrita a abstração das palavras, ou a entrega mútua de seus corpos; mas a concretização simbólica de um sentimento fora do resguardo, interno, introvertido e real somente para ele e um punhado de pessoas próximas de sua vida, e sim algo que gritasse, saísse sem pedir licença e mostrasse os dentes para o mundo dos homens. Era o sacrifício do corpo em função da redenção do espírito ao ver a alegria de um sorriso, marcado pela surpresa do que se foi feito, mesmo que não tenha sido recíproco.

Não posso negar o caráter mágico que permeava a relação daqueles dois. Tudo era de certa forma mais lindo, quando a presença destes faziam parte de quaisquer ambientes. Era como se a aurora que os envolviam também contagiassem os demais, tornando tudo em volta deles uma extensão do bem-estar e sentimento de bem afortunados, que gozavam. Diferentemente de muitos, que perdem o seu tempo sobre o desenrolar da trama do drama sobre a vida alheia, sobretudo neste espaço concebido a nós, eles nunca perderam tempo um com o outro e sim preencheram o vazio que o mesmo representa, com doses cavalares de carinho e afetuosidade que ambos desfrutavam mutuamente.

Ele que já enfrentou literalmente mudanças drásticas em sua vida, unicamente com a intenção de viver mais de perto com o outrem e ver no sorriso dela o reflexo da felicidade, que também sentia correr em suas veias, assim como, para não fazer da distância mais um tema de música em que separa “dois corações e uma história”. Deixou muito de si para traz, tendo em suas raízes o único pilar de segurança para cavalgar até o além mar e fazer do coração de sua Helena, uma colônia de suas ambições. Saiu do conforto do lar, dos beijos da mãe, das noitadas com os amigos, do calor quente dos domingos, da ressaca moral do dia seguinte, das brincadeiras com Rex, da verdade ou conseqüência com os colegas de classe, de brincar de médico com a prima, do café forte e amargo da avó, da musculação na acadêmia que não fazia, entre outras coisas. Enfim, largou tudo e passou por cima da loucura imensa que a mudança causa em nosso íntimo e buscou nos braços de sua garota, o único refúgio e propósito de vida.

Ele, que num primeiro momento e em um passado relativamente distante, já tinha provado deste fruto proibido do jardim das delícias e encontrado em seu sabor um infinidade de sentimentos, que apesar de lançá-lo a um estado de espírito de satisfação e benevolência, se confundia no sentido de uma felicidade de momentos passados nunca vividos e na possibilidade de um dia poder vivê-los, fazendo dos arrepios em que sentia em sua canela a companhia ideal para as borboletas que voavam alegremente em seu estômago. Eram estes, os sentimentos primeiros que deram impulso a paixão e ao amor avassalador, que este sentira ao se entregar por completo a ela, que justificavam seus atos, suas ações, suas palavras e sua expressão facial que em nada disfarçava sua cara de abobado.

Mesmo levando em consideração o peso que a paz de ser agraciado por este turbilhão de sentimentos, mais do que poeticamente romanceado e almejado por todos traz, é difícil compreender o porquê desta sua auto-mutilação do corpo, de querer representar na carne o que está marcado na alma. Pior que deixar no corpo a marca daquela que te faz feliz, é ver no dia seguinte que esta chaga ainda está em você, porém está sozinha e sem a cômoda companhia daqueles sentimentos, que outrora eram tão arrebatadores e que faziam do coração um espaço pequeno para morar. A maior tristeza não está somente em ver seu sol se distanciar e com isso sentir o vazio do inverno te congelar, o vento te resfriar e a terra te calejar. Entretanto, está em presenciar os sintomas do amor tornar-se um hematoma da dor, transformando aquele símbolo em um estigma capaz de eternizar a aflição do espírito em uma agonia corrosiva, graças a uma cicatriz que faz daquelas lembranças, uma memória viva sem a possibilidade de ser esquecida.

Em meio a este drama, do testemunho vivo em ver um homem passar da boa fortuna a um rio de lágrimas de sangue, que teve sua dor acentuada devido a uma escolha mal feita daquilo que era para ter um significado único, de ilustrar simplesmente a euforia do amor, adquirir uma nova roupagem e, assim, fazer desta sua nova cara uma característica principal. E nesta espécie de ‘Catarse’ relatado nesta história, percebemos que estes sentimentos de êxtase, pureza e intensidade que, nada mais são do que uma extensão do afamado e sublime amor abrupto, podem ser somente a ponta de um iceberg e também o primeiro passo tomado para abraçar uma condição de vítima, e saborear a repugnância da dor.

o, transformando aquele sAmor se tornarem um ematoma da dor congelar, o vento te resfriar e a terra te sujar

Emanuelle


Eu ainda era jovem, completamente mais novo e faltavam alguns anos para adentrar na minha pré-adolescência e, no entanto lá estava eu, inicialmente nas madrugadas de todas as sextas-feiras e mais tarde nas de sábado, garantindo seu ibope, sempre no mesmo Bat-Canal. Não era simplesmente um hábito, eu entendia o que fazia como uma religião rigidamente controladora, fazendo com que me comportasse estarrecido diante daquelas cores, que certamente não passavam de uma ilusão de óptica oriundas da refração da luz, das imagens, cenas, sons, palavras, ações e das histórias que são construídas em prol de uma única meta, do objetivo-mor e supremo que se pode esperar de uma trama que envolve toda a avassaladora natureza dos homens.

Perdido no meio de tantos desejos, investidas e troca de olhares eu tomava o que observava como uma experiência não vivida, norteando minha singela vida para uma abordagem quase que hedonista. Ela que tinha seu nome na maioria títulos e/ou temas envolvendo os seus “Tesouros”, “segredos”, “as freiras”, sua versão “negra” e até mesmo “perdida no espaço.” E o fato de inúmeras vezes, demasiadamente, ter presenciado as suas aventuras reprisadas naquela caixa alienadora do saber e do viver, não eram suficientes para me afastar dela e sim o oposto, pois cada vez mais em que eu apreciava tal espetáculo, era com mais veemência as minhas críticas que sempre tendiam para o esplêndido e sem dúvidas despertava e ainda desperta e não somente em mim, uma infindável sensação de bem-estar e fúria intempestiva no meu âmago, assim como no de algumas fêmeas.

Entre um intervalo e outro eu era impulsionado a sentar no majestoso trono mágico ou no meu leito do sono não eterno, para contemplar de maneira corpórea o que aquelas incalculáveis sugestões retratadas em uma imagética simbólica de um abstrato condicionado ao meu inerente universo paralelo, liderados pelo inconsciente e subconsciente, em algo prático, num pecado digno de bulas papais, de desperdício da vida, da semente fora da terra, do sêmen, da masturbação. Mais do que um virtuoso e invólucro corpo humano, mais que a simples sorte do destino de tê-la interposto no meu caminho e de outros, ela certamente foi eleita como a musa mais graciosa, carismática e almejada de uma geração, de toda a complexa confraria masculina de inescrupulosos sentimentos platônicos.

Emanuelle, este era seu nome, sua glória e seu triunfo. Ela está para nós varões como os sagrados livros de romance pornô “chanchada” JÚLIA, SABRINA, BIANCA, JÉSSICA entre outros estão para as solteironas de plantão ou mulheres mal amadas; típicas senhoritas e senhoras habitantes de vilarejos provincianos de hábitos únicos que entendem a conduta da vida alheia como errônea e imoral, causando-lhes espanto, autorizando-as a tratar tais ações por um prisma psico-social de auxílio comportamental.

Porém, quem não se lembra dos famosos dizeres destes livretos tão infames propagadores de volúpia pecaminosa da luxúria, que tem nos rostos cansados e indiferentes das mulheres ardidos, a sua morada. Relatos do tipo: “(...) ao tocar um dos seus seios, ele percebeu que ela não usava sutiã e aprofundou ainda mais o beijo (...) uma das mãos másculas a segurava pela nuca e ela começou a se entregar, incapaz de conter as sensações de prazer que o beijo lhe causava (...) estava mergulhando em um mundo de paixões intensas onde só estivera uma vez (...) Não tirou as Sandálias dela, pois era inacreditavelmente erótico usar sandálias de salto alto com tiras amarradas enquanto os dedos dele traçavam círculos em suas ancas, esfregando a concavidade detrás dos joelhos, acariciando suas coxas, as mãos abarcando delicadamente o bumbum redondo para depois deslizar na curva da cintura e então se espalhar pelo ventre, indo e voltando naquela área sensível abaixo dos quadris.”

Queria viver o suficiente para ver a História consagrar minha deusa, absolutamente maior que uma pop-star, ser convocada a fazer parte do panteon das mulheres inestimáveis deste mundo. Ao Lado de Eva, Pandora e da impopular Lilith entre outras dignas de papel principal nas novelas de Manoel Carlos, como a Virgem das virgens, Madalena e a própria Helena de Tróia. Entretanto, você merece está ao lado daquelas que se atreveram na vida, que fizeram seu próprio caminho e transgrediram. Sempre sedenta de prazer, nunca mediu esforços para ter seu homem, isto está claro nas suas exibições, sempre querendo mais e mais. Numa insaciabilidade apoteótica que a descontrolava e jogava-a no mundo carnal das sensações e que depois das ardências provocados no corpo provenientes de beijos para lá de salientes, ela fazia questão de comprimir seu quadril contra o de seu parceiro masculino, buscando ali o seu convite VIP para os Campos Elísios.

Diferentemente dos execráveis pornôs que se tem por aí, que são desprovidos da beleza e afetuosidade que só você possui, deixando em frangalhos qualquer mente sã capaz de perceber o que é definitivamente poético e deleitoso, graciosamente emanados por sua aura dourada. É por estas e outras que tenho absoluta certeza da eternidade vivaz e sagrada de sua memória e, ao mesmo tempo, de sua indubitável importância a toda uma geração.

Dito e Feito


Antigamente eu era um Guarapan,
hoje sou uma baré Tutti Frutti,
um verdadeiro "The frash Man".
descobri isso no clímax da madrugada e tive certeza no acordar do nosso astro Rei.

Sonhei em ir,
sonhei e quase fui,
sonhei e quase almejei,
sonhei e quase um grande Zaap eu levei.

Imagine que racionalidade não presta,
dois animais vão para a rua
e todos sabemos quais são as verdadeiras intenções de ambos.
Um já quer logo morde a presa,
O outro fica no jogo tentando escapar, mas por quê escapar?
Se no mais sincero pensamento o que se quer é ser mais animal possível?
Por que então não ficastes debaixo dos galhos de sua casa?

Puritanismo demais azeda qualquer doce e, quando azeda, a única forma de digerir é com pinga.

E o ser Infeliz que é ao deitar no seu improvisado colchão de palha
começa a achar que tem vocação para escrever,

pensa que vai escrever bonitas palavras

para expressar a revolta que foi de ter saído debaixo de suas galhas.


Seria muito mais fácil se a felina ficaste ao relento do tempo, do vento e da solidão.
Por que não dizer o motivo maior de não querer a sua zoomorfização?
Tudo é muito confuso.
Queria que neste exato momento
uma bela voz gritasse em meus ouvidos
"Abra os olhos".







Por Alexandre "Fudaumn"

O Jovem Trovão



Fim de noite. Normalmente estaria cansado e feliz, ainda mais depois de uma embriaguez satisfatória e com pouco custo; na verdade estou sim, cansado e feliz. Já são algumas horas da madrugada e estamos “secos” a procura de mais um esquema, na tentativa pecaminosa de conseguir ver a noite virar dia e nos tornar lenda entre o restante da galera. Éramos pouco menos do que meia-dúzia e, enquanto discutíamos nosso futuro numa boêmia mesa de bar, também tratávamos de nossa manutenção, fazer nossos lábios adormecerem com o entorpecimento alopático de nossa mente graças a uma bebida que, entre outras coisas, tinha a mesma serventia para ascender complexas churrasqueiras. Inusitadamente nos aglomeramos no carro com o intento de nos esquivar do frio que era latente e que o desejo de uma lareira ali bem na nossa frente era freqüente (até rimou). Instintivamente seguimos as batidas, as luzes que coloriam o céu com suas incalculáveis variações de cores com holofotes suficientes mesmo para chamar o BATMAN.

Ao chegarmos ao nosso destino nos deparamos com ele, o de sempre, o mais afamado de todos os cambistas que sem dúvidas tem um pé nas terras quentes do nordeste e que, por míseras moedas de ouro, nos permite entrar naquele palco surreal que, “certamente revolucionou uma geração, integrou o homem à tecnologia, à dança e à natureza”. Em meio àquela cadência de batidas em uma loucura audiovisual, num ritmo alucinante que te obriga, apesar do sorriso no rosto, a fazer coisas um tanto quanto desconexas sem o menor pudor ou preocupação com a velha moral e os bons costumes, numa esfera de pura integração humana e curtição, que os personagens se desenhavam.

Ele, o mais o fidedigno dos brothers não conseguia tirar os olhos dela, nem por um segundo, mesmo com todo empenho em tentar manter a discrição. Eu, que de longe sempre o observei, neste momento não poderia deixar de fazer o mesmo, direcionando toda minha atenção a ele, justamente por perceber que aquela era a oportunidade perfeita que ele tinha para fazer o que tinha de ser feito. Ainda me recordo de suas palavras em relação a ela, que não por ventura tem laços sanguíneos comigo, em que ele relatava toda uma falácia emblemática e simbólica carregada de sentimentos, covardia, enaltecimento entre outros termos romanceados, surpreendendo-me e fazendo-me militar em seu pensamento onde se expressar, encher os olhos para falar, ser romântico na íntegra não é sinal de fragilidade ou fraqueza e sim de mostrar a veemente força dos nossos sentimentos.

Porém não entendia muito sua forma de agir, sua reflexão profunda e indiferente ao meio, sempre muito introspectivo e calado, tudo parecia um dejá vu de outros tempos, amores e/ou paixões paralelas de seu repertório. Uma conduta de quem estava esperando algo ou alguma coisa. Certamente ele estava na tocaia, mas também pensei que ele poderia estar com sono, o que rapidamente deixei de suspeitar, porque havia certa demasia na sua concentração estampada em sua expressão de geraiseiro. Numa confusão de tentar entendê-lo, de ler seus passos, identificar uma estratégia, seja ela qual for, de se jogar, falar, “agarrar”, usar a força, mas que pelo amor de Deus ele tinha de fazer alguma coisa e, inclusive eu estava com medo por ele. Na pior das hipóteses ele tinha que vestir a carapuça de um Ranger vermelho e se tornar um líder e tomar a iniciativa, resolver tudo logo, porque paciência já não se encaixava naquele contexto.

O inevitável aconteceu e um “outro alguém” entra em cena. Ele, o outro, com seu comportamento típico de falar o que é desagradável, de ser um incômodo maior do que pedra nos rins, digno de ser isolado e afastado do convívio social, mas que não deixava de ser nosso amigo, estava conosco no carro, naquela alegria na busca do esquema perfeito e, consequentemente, do nosso fim de noite que era para ser dos Deuses, assim como e em toda nossa jornada do dia e, não somente deste dia, mas também dos dias de adolescente e da infância, um amigo íntimo, das antigas e pior, era complacente com os sentimentos de nosso primeiro personagem.

E neste amálgama de sentimentos, vontades, censuras, manifestações, comportamentos, preocupações, embriaguez, pessoas, metas, objetivos e tudo mais para encher lingüiça para retratar a dor de um “irmão” é que se forma um ambiente de trevas. Lá estava ela, toda linda, serena, com seus lábios roxos, carentes de sangue e calor, sua pele contrastava com a madrugada que demorava ir embora, com seu tamanho compacto e um suntuoso sorriso que, diga-se de passagem, continha uma luz ilimitada, necessitando do aquecimento de um abraço humano, sendo às vezes convidativa, receptiva; e em um destes lapsos de guarda baixa é que o oportunista se faz competente e o que outrora era considerado um amigo, que nada mais é do que um parente, na qual temos o luxo de escolher e que até então tinha somente um desempenho peculiar na forma de agir, mesmo com a falta de seu bom senso e discernimento, agora tornara-se inescrupuloso e hostil, tendo de ser tratado como criminoso de alta periculosidade.

Naquela cena escandalosamente exposta aos olhos de todos que ali estavam e julgavam aquilo só como mais uma conseqüência normal do clima formado graça às batidas desgastantes dos Dj’s e que se configurava numa pegação normal, de alguém que se deu bem na night. Estes desconheciam os bastidores que alicerçavam aquela situação com protagonistas e antagonistas de uma história que não se desenvolveu, e de alguém que ficou jogado à margem de um rio chamado destino.

Na tentativa de poder dizer algo que o fizesse melhor, que o deixasse mais para cima e, que aquela cena presenciada, de ver aquela que fazia seu coração capotar se render aos desencantos de um “outro alguém”, ele num surto de maturidade me diz: “O melhor de amar alguém em segredo é não ter a oportunidade e nem a sorte de tê-la em seus braços, pois isso te aproximaria dela e esta proximidade pode ser letal e macular aquele sentimento que até então você tinha por ela, antes de possuí-la; não quero ter a possibilidade de sofrer, prefiro esta felicidade que, por menor que seja não deixa de me fazer bem e, que mesmo sem desfrutar de seus beijos é melhor que o sofrimento em potencial na qual seríamos vítimas se houvesse uma entrega mútua”. Depois destes argumentos fiquei calado e, a partir deste dia, esta também seria minha melhor desculpa por compartilhar da mesma covardia.

Tudo se resume a tão pouco.

Zaap!

Espinho Carmesim


Cansado das mesmas respostas, palavras, desculpas, “sugestas”, argumentos, mecanismos de defesa, da mesma balela, do mesmo “zaap”. Não existe tristeza maior que ouvir repetidamente o de sempre: “nós somos amigos”. E aí? Só isso? Falta uma resposta melhor? Isto te faz feliz? Também não importa. Não importa também se a culpa é minha por sempre abordar “amigas”, não amigas, estranhas, rivais, inimigas ou qualquer coisa que seja. Exaurido! Esta é a palavra que mais identifica meu estado de espírito, justamente pela mesmice, chateação. Consigo até prever com detalhes a resposta alheia, antecipando onde cada vírgula estará empregada na frase. E logo após mais uma batalha lutada, uma saga não vivida, uma história prosseguida numa estrada sem bifurcações, opções, ramificações, lá vou eu todo ardido e cheio de nós no corpo, na mente, na garganta. Num desespero introspectivo só meu, que não se expande, externaliza, manifesta, se libera e que me autoriza a não ser covarde, cúmplice, complacente com minha própria cruz, Karma ou sei lá o que, eu “me vou”.

Sequer tenho uma alegria esporádica, de quem é surpreendido com um presente de Natal ou então da euforia alegre e expressiva estampado no rosto de uma noiva do século XIX prestes a subir ao altar; queria só ter um sentimento desta natureza, unicamente para contrastar, ter uma vida normal, dual, dicotômica entre Dor/Prazer, felicidade/tristeza e tudo aquilo que todos já sabem que existe, porém não agüentam mais discutir ou ouvir.

Em meio a esta turbulência que, diga-se de passagem, anda de mãos dadas com minha futura crise de inferioridade é que vou ao encontro dele, único capaz de me entender, compreender, depreender, absorver, inferir e todos os termos que são viciosamente usados nos enunciados de provas de vestibulares, principalmente na área de humanas, é que tenho minha “alma gêmea”, aquele que faz parceria comigo, teve o mesmo treinamento que eu, mesma educação emocional, preparo sentimental, covardia amorosa, refém da carência masculino e desprovido do orgulho (capital) machista para poder mascará-la com atitudes e pegada. Ele que certamente deve ter sido um garçom numa vida anterior e, consequentemente, ouvido todo tipo de confidência de mal amados, cornos e inadimplentes com a vida não palpável.

Numa embriaguez cintilante e tênuamente obrigatória de vinho que nos permitimos trazer a tona nossas lembranças, rancores, desesperos, infidelidades do lado de lá, inércia e tudo mais que contempla a dor. Uma dor sublime, um tormento capaz de comover até o mais impassível dos corações, deste modo, confundindo todos os meus sentimentos que, a esta altura, já se encontram sinestesicamente deturpados, apresentando-se com uma fugaz singularidade inestimável; uma dor ingênua, cândida, algo que faz minha mente navegar pelo passado, nada distante e, resgatar uma tristeza única, ímpar, do tipo das histórias da Walt Disney quando Mufasa, pai de Simba é morto pelo seu irmão Scar, e o pequeno Simba encontra seu pai estirado ao chão e, mesmo assim, suplicava para que ele se levante, uma das cenas mais marcantes em meu coração, ou então, segundo a cultura oriental de mangás e/ou animês, quando Shaka de virgem, Cavaleiro de Ouro é morto por outros três Cavaleiros do mesmo status – Saga, Kamus e Shura – com um golpe proibido, ou pior, quando Naruto fica sabendo da morte de seu mestre Jiraya-sensei, uma tristeza sem precedentes.

Depois de vislumbrar esta exaltação da dor, sentimentos e percepções derivados de um devaneio nada utópico, é que encontro um chão para pisar, frio, mas sólido, um amigo para desabafar e a imutável realidade para desbravar. E no intuito otimista de ter ao menos uma condição de esboçar um sorriso, mesmo que mecânico e amarelo, religiosamente oculto dentro do peito que vou caminhando, descalço, nu e com um semblante digno de uma imagem Sacra barroca, que busco uma garota que independentemente de ser uma qualquer ou não, somente quero a oportunidade de chamá-la de minha.


Desculpa



Prazer! Meu nome é perdão.
Um pedido por perceber,
Muitas palavras ao escrever
e soltas para se entender!!
Porque não sei o que fazer,
quando ao dizer coisas tantas,
não consigo apreender
sequer os pensamentos de escrevê-las.
Este fazer dizer no escrever
que complica meu entender,
Que faz o meu ser (eu)
erradamente perceber que,
por pensar que está confuso
o outro não a vai compreender.
E julgar assim, sem perceber
que o próximo pode compreender,
acho justo este meu nome.
Prazer! Meu nome é perdão;
Mas quem sabe desculpa.


Numa garimpagem excêntrica, numa tentativa rústica de identificar o desnorteio (da psique) de um outrem que, em meio a confusão da dor, do ser, do vir e do está é que buscamos os melhores contos, histórias, realidades, fantasias, dramatizações, drasticidades e a honestidade do amargo, na qual somos complacentes do contexto ímpar, porém não único da vida de um HOMEM, de sua "catarse" sentimental diante de um balcão de bar.


Rodolpho Bastos
&
Tim Pires

Afinados

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