Certa vez vi que Jiraya procurava no lixo de suas lembranças uma resposta a suas preces. Ele não se via com bons olhos aos quarenta, pois carregava os mesmos ‘demônios’ de sua juventude. E somado a isto, hoje se encontra quase sem cabelos, dentes amarelados e dedos fedidos por causa do cigarro; tem a pele do rosto estragada do barbear mau feito. Apesar de seu horror a morte, era com freqüência que pensava em dar fim a sua vida, estava claramente perdido, sem noção do porque estava vivo. Sentia-se desconfortável com qualquer verdade, mesmo assim queria crescer, se afastar da massa, excluir o conforto e com isso se preparar para o sofrimento. Sabia que tinha de superar o sexo, não ser mais vítima do poder delas [mulheres], ou seja, de sua própria luxúria e assim resgatar seu herói interior. E diante de tantas tarefas, Jiraya questionava se suas metas eram de fato suas, ou se aconteceram como um acidente. Era preciso decidir entre apropria-se ou não destas metas pra não tornar sua vida um acidente também.
Fatigado por estas questões, preferiu ir dormir e encarar outra realidade, um mundo de um sonho falante, que quem fala é a voz de sua consciência, de suas vontades. Um terreno em que criatividade e descoberta não precisam ser geradas na dor; onde perigo e mistério não carecem andar de mãos dadas. Neste mundo, o tempo não é mais um fardo e viver além dele não representa mais um desafio. Deveres não são mais um pretexto e nem uma cortina para o isolamento. Um lugar que dispensa ‘modos secretos’ de suportar a solidão e com isso não ter de se preocupar que seu corpo só seja descoberto pelo fedor, mas sim em meio alegria do convívio. Onde a melhor felicidade é realmente aquela que acontece e não a que poderia acontecer. E por se sentir tão bem acolhido neste [quase] novo mundo é que nosso amigo Jiraya resolveu nunca mais acordar.